Dra. Aline Vieira da Rocha - fisioterapeuta pélvica comportamental - CREFITO 10063-F

O conto da verdade

A verdade - Conto das 1001 noites

Um dia, a Verdade resolveu visitar um grande palácio. E tinha que ser justo o palácio onde morava o sultão Harun al-Rashid. Envoltas as lindas formas num véu claro e transparente, ela foi bater na porta do rico palácio em que vivia o glorioso senhor das terras muçulmanas. Ao ver aquela formosa mulher, quase nua, o chefe da guarda perguntou-lhe:

- Quem é você?

Sou a Verdade! – respondeu ela, com voz firme – Quero falar com o seu amo e senhor, o sultão Harun al-Rashid. O chefe da guarda, que cuida da segurança do palácio, apressou-se em levar a nova ao grão-vizir.

– Senhor, – disse, inclinando-se humildemente, – uma mulher desconhecida, quase nua, quer falar ao nosso soberano.

- Como se chama?

-Chama-se Verdade!

- A Verdade! – disse o grão-vizir espantado.

– A Verdade quer penetrar neste palácio? Não! Nunca! Que seria de mim, que seria de todos nós, se a Verdade aqui entrasse? A perdição, a desgraça! Diga a ela que uma mulher nua, despudorada, não entra aqui!

 Voltou o chefe da guarda com o recado do grão-vizir e disse à Verdade: – Aqui não pode entrar, minha filha. A sua nudez iria ofender nosso Califa. Volta, pelo caminho de onde veio.

Porém, quando Deus criou a mulher, criou também a Obstinação. E a Verdade continuou a alimentar o propósito de visitar um grande palácio. E tinha que ser justo o palácio onde morava o sultão Harun al-Rashid. Persistente, ela cobriu as peregrinas formas com um pano grosseiro como os que usam os mendigos e foi novamente bater na porta do suntuoso palácio em que vivia o glorioso senhor das terras muçulmanas.

Ao ver aquela formosa mulher vestida tão grosseiramente com trapos, o chefe da guarda perguntou-lhe:- Quem é você?- Sou a Acusação! – respondeu ela, brava. – Quero falar ao seu amo e senhor, o sultão Harun al-Rashid, Comendador dos crentes!

O chefe da guarda, que cuida da segurança do palácio, correu a entender-se com o grão-vizir: – senhor, – disse inclinando-se humildemente – Uma mulher desconhecida, com o corpo envolto em panos grosseiros, deseja falar ao nosso soberano.- Como se chama?- Chama-se Acusação!

- A Acusação! – disse o grão-vizir, aterrorizado. Que seria de mim, que seria de todos nós, se a Acusação entrasse aqui? A perdição, a desgraça! Diga a ela que aqui não, aqui não pode entrar! Diga-lhe que uma mulher, vestida com panos grosseiros, não pode falar ao nosso amo e senhor!

 Voltou o chefe da guarda com a proibição do grão-vizir e disse à Verdade:- Aqui você não pode entrar, minha filha. Com estas roupas rasgadas, próprias de um beduíno rude e pobre, não podes falar ao nosso amo e senhor, o sultão Harun al-Rashid! Volta, em paz, pelo caminho de onde veio.

Vendo que não conseguiria realizar seu intento, ficou ainda mais triste a Verdade, e afastou-se vagarosamente do grande palácio do poderoso senhor. Mas…Quando Deus criou a mulher, criou também o Capricho. E a Verdade encheu-se do vivo desejo de visitar um grande palácio. E tinha que ser justo o palácio onde morava o sultão Harun al-Rashid.Vestiu-se com riquíssimos trajes, cobriu-se com jóias e adornos, envolveu o rosto em um manto de seda e foi bater à porta do palácio em que vivia o glorioso senhor dos árabes.

Ao ver aquela encantadora mulher, linda como a quarta lua do mês do Ramadã, o chefe da guarda perguntou-lhe:- Quem é você?- Sou a Parábola ! – respondeu ela, em tom meigo. – Quero falar com o sultão Harun al-Rashid.

O chefe da guarda, que cuida da segurança do palácio, correu a entender-se com o grão-vizir.- Senhor, disse, inclinando-se humilde, uma linda e encantadora mulher, vestida como uma princesa, solicita a audiência de nosso amo e senhor, o sultão Harun, Emir dos crentes!

- Como se chama?- Chama-se Parábola!- A Parábola! Disse o grão-vizir, cheio de alegria. – A Parábola quer entrar neste palácio? Que entre! Bendita seja a encantadora Parábola. Cem formosas escravas irão recebê-la, com flores e perfumes. Quero que a parábola tenha, neste palácio, a acolhida digna de uma verdadeira rainha! E foram abertas as portas do grande palácio de Bagdá e a formosa peregrina entrou.

E foi assim que, vestida de Parábola, a Verdade conseguiu entrar no grande palácio do poderoso Califa de Bagdá, o sultão Harun al-Rashid, não nua e crua, nem em forma de acusação, mas através de um pequeno conto.